A cada 11 dias, uma mulher é assassinada no Distrito Federal. No primeiro semestre, a Justiça recebeu 7,2 mil pedidos de proteção às vítimas de violência doméstica.
Por Marília Marques, G1 DF
Mulher vítima de violência doméstica (Foto: Agência Brasil/Divulgação)
Uma mulher é morta a cada 11 dias no Distrito Federal devido a crimes de ódio motivados por questões de gênero. Medidas protetivas tentam conter essa onda de violência em que, normalmente, a vítima tem vínculo com o agressor.
De janeiro a junho deste ano, a Justiça do DF recebeu 7.280 pedidos de proteção a mulheres que denunciaram algum tipo de violência física, psicológica ou moral. O tribunal, no entanto, afirma não ter o levantamento de quantos foram concedidos ou negados.
Em 2016 foram 12.702 solicitações de medidas protetivas. No entanto, pouco mais da metade foi deferida (6.747).
Feminicídio: em 88% dos casos no DF, agressor tem relação com vítima
Mesmo com a Lei Maria da Penha, criada para proteger mulheres em situação de violência doméstica, só este ano 21 foram assassinadas e os crimes registrados como feminicídio no DF .
Sob este cenário, duas juízas conversaram com o G1 sobre a efetividade das medidas e o que pode ser feito para interromper o ciclo de violência. Veja abaixo o que dizem as juizas Rejane Jungbluth e Theresa Carina de Figueiredo.
Pedidos de medida protetiva feitos por mulheres à Justiça do DF
Acolhimento da vítima
Para a juíza da Vara de Violência Doméstica de São Sebastião, Rejane Jungbluth, apenas o deferimento da medida de proteção não basta, "é necessário que a vítima seja acolhida desde o início pelo sistema de Justiça".
"Um pronto atendimento por núcleos multidisciplinares com psicólogos com o fim de fortalecer a mulher é imprescindível. Além disse, são necessários mecanismos que possam assegurar maior segurança com participação da polícia militar na proteção das vítimas", afirmou.
A magistrada do juizado especial do Recanto das Emas, Theresa Carina de Figueiredo, atuou por quatro anos com mulheres vítimas de violência doméstica. Para ela, a maneira adequada de garantir a real proteção é "oferecer atendimento psicológico e aconselhamento jurídico às vítimas".
"Tenho percebido que as vítimas de violência não conseguem mensurar o risco adequadamente, por estarem vulneráveis e, às vezes, envolvidas emocionalmente."
Mulher vítima de violência doméstica (Foto: Marcos Santos/USP Imagens)
"Assim que o homem descumprir a medida, isso deve ser comunicado à autoridade judicial para que o ofensor seja preso", explicou a juíza. "Não é uma questão de culpar a vítima, mas nesta fase de medida protetiva, o olhar deve ser sobre a possibilidade de acautelar a vida da mulher e da família".
E se o pedido for negado?
Para solicitar a medida protetiva e, dessa forma, obrigar o afastamento do agressor, a mulher precisa registrar boletim de ocorrência na Polícia Civil. Na delegacia, o responsável ou plantonista encaminha o pedido a um juiz. A medida pode ser deferida ou negada.
Para a tomada deciões, a juíza da vara de São Sebastião explica que é necessário que o magistrado tenha provas sobre o histórico de agressões sofrido pela mulher.
"São necessários elementos que mostrem o ciclo de violência que a vítima vivenciou, e não apenas do dia em que ela decidiu registrar uma ocorrência", afirma.
"Quanto mais detalhes o magistrado tiver, melhor será para o deferimento da medida protetiva, assim como para outras decisões de proteção à mulher e à sua família."
Normalmente, no Distrito Federal, a negativa ocorre quando o pedido é mais restritivo, explica Theresa. Em casos em que a mulher pede que o agressor saia de casa ou quando há brigas por bens, por exemplo.
Maria Regina Araújo, vítima de feminicídio no DF (Foto: TV Globo/Reprodução)
Morta 10 dias depois
Um caso recente de feminicídio no DF é o da empregada doméstica Maria Regina Araújo, de 44 anos. Ela foi morta a facadas na noite de 26 de agosto. Dez dias antes de ser assassinada, ela pediu à Justiça do DF que o marido ficasse longe dela, mas teve o pedido negado.
Juíza negou medida protetiva para mulher morta a facadas pelo marido no DF
Ela e o marido viviam juntos há mais de 12 anos e a filha do casal, de 8, presenciou o crime. Maria Regina Araújo levou mais de 20 golpes de Eduardo Gonçalves de Souza, que já havia sido denunciado por violência doméstica.
Na sentença, a juíza Eugenia Christina Bergamo Albernaz afirmou que os conflitos entre os dois eram devido ao "desgaste do convívio matrimonial" e, portanto, não haveria autorização para aplicação da Lei Maria da Penha.
"Não se vislumbra, num primeiro momento, o iminente prejuízo à vítima a ensejar o deferimento das medidas pleiteadas", diz a juíza na sentença.
Brasil é o quinto país em que as mulheres mais sofrem agressões (Foto: Reprodução/JN)
Risco à mulher
As juízas que conversaram com o G1 também comentaram sobre o risco que a mulher corre quando o agressor é preso, mas em seguida, solto.
Um homem que ameaça uma mulher pode ser colocado em liberdade se não houver provas. O direito é garantido no Código de Processo Penal e na Lei Maria da Penha. Nestes casos, Theresa recomenda que a vítima esteja informada que não deve permitir a aproximação.
"É preciso avisar a uma rede de apoio [familiares, amigos ou polícia] sobre a soltura do ofensor e buscar ajuda."
Ainda de acordo com a magistrada, advogados do Provid [proteção à vítima] poderão mensurar esse risco. "Vemos homens descumprindo a lei, e mulheres que não procuram auxílio", afirma a juíza.
"É importante não flexibilizar a [medida] protetiva, nem permitir a aproximação, porque a pessoa se coloca em risco."
Fonte: G1
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