O que é preciso saber para administrar com sabedoria a evolução dos bens, o saldo bancário e a vida conjugal
Com a melhor das intenções do mundo e no embalo dos corações apaixonados, muitos jovens se casam sem o menor conhecimento de que a união sacramentada no cartório tem profundas implicações na vida patrimonial de cada um dos cônjuges. "Tudo vale a pena no começo, mas depois é meu bem pra cá e meus bens pra lá", resume, com humor, o advogado paraense Zeno Veloso, de Belém, especializado em direito de família. Caso a vida conjugal não dê certo, as divergências quanto à partilha de bens costumam aflorar em meio a disputas que envolvem do bate-boca a longos processos na Justiça. Uma simples visita a um advogado pode esclarecer vários pontos de dúvida e evitar sustos futuros com garantias de direitos e deveres de cada um.
Embora haja casais românticos que não gostem do termo, o casamento civil é um tipo de contrato, cuja formalização visa a proteger os interesses de marido, mulher e descendentes. O conjunto de normas que disciplinam as relações patrimoniais entre marido e mulher recebe o nome de "regime de bens". Atualmente, são três os principais em uso no Brasil: comunhão universal, comunhão parcial e separação total .
19 respostas sobre dinheiro e casamento...
...dadas por um dos maiores especialistas em direito
de família do país, o advogado Segismundo Gontijo
O que é regime de bens e qual sua conseqüência para a vida prática do casal?
O regime de bens é uma espécie de estatuto que disciplina a parte material do casamento. Identifica que tipos de bens serão particulares de cada cônjuge e quais serão comuns de ambos. Embora seja um instrumento particular, um contrato entre duas partes, ele tem valor legal em futuras disputas judiciais entre o casal.
Qual o regime de bens mais adotado?
O da comunhão parcial de bens é o regime escolhido com maior freqüência, pois torna propriedade comum os bens adquiridos depois do casamento e mantém aqueles anteriores como posse particular. Herança e doação ficam para cada um. O regime de separação total de bens mantém a propriedade em nome de quem a adquiriu antes ou durante o casamento.
Qual a diferença entre pensão para os filhos e pensão para a mulher?
A pensão alimentícia dos filhos é dever incontestável dos pais e serve para manter o padrão socioeconômico em que os filhos viviam antes da separação, compreendendo despesas com habitação, saúde, educação, vestuário e lazer. Em geral, o juiz decide isso rapidamente. A pensão alimentícia para a mulher deve cobrir os gastos necessários à manutenção do padrão de vida até então desfrutado pelo casal, mas depende da comprovada necessidade de quem recebe e da capacidade de quem for pagar. É um tema geralmente explosivo, que pode arrastar-se nos tribunais.
Quando a mulher tem direito a receber pensão alimentícia?
Hoje não são mais aceitas as mulheres como "profissionais da pensão". Há uma tendência entre os juízes de não conceder pensão à mulher quando ela for jovem e saudável, tiver curso superior ou uma atividade que permita o acesso ao mercado de trabalho. Há muitos casos em que é concedida uma pensão provisória até que a mulher tenha condições efetivas de se manter. Entretanto, quando conseguir comprovar sua necessidade, inclusive naqueles casos em que busca assegurar o padrão de vida do período do casamento, a mulher poderá obter pensão alimentícia na Justiça, sem destinação a despesas suntuosas.
Isso vale para qualquer regime de bens?
Sim, não importa se é comunhão parcial ou universal ou separação total.
Há alguma outra condição em que a mulher não consegue a pensão?
Sim, naqueles processos de separação litigiosa em que ela é considerada culpada pela falência do casamento (como em caso de adultério, por exemplo).
A lei estabelece um valor para a pensão alimentícia para a mulher?
Não. Fala genericamente em cobrir a necessidade. O juiz decide de acordo com cada caso. Apenas a título de referência, há gente que usa o valor de um terço do rendimento líquido do marido.
O homem pode pedir pensão à esposa ou à companheira?
Sim. Funciona de maneira semelhante – a principal condição é ficarem comprovadas a necessidade material do marido e a condição financeira da mulher em pagar. Hoje, esses casos já ocorrem com mais freqüência.
Num regime de comunhão parcial, como se dividem os bens comprados por ambos antes do casamento?
Vale o regime societário de co-propriedade. Ou seja, ambos são donos na exata porcentagem paga na hora da compra.
Na véspera do casamento, a noiva fez dívidas no cartão de crédito do noivo para comprar objetos de decoração e pagar a viagem da lua-de-mel. Ela é co-responsável pelo pagamento?
Sim. O Código Civil estabelece que as dívidas provenientes de despesas com o casamento em proveito comum devem ser repartidas em partes iguais.
A mulher descobre que o marido sustenta outra família. Na separação, quais são os direitos da "outra"?
A lei prevê a possibilidade de anulação, pela esposa, da doação dos bens feita pelo marido à "outra". Mas esta pode ganhar na Justiça o direito a parte do patrimônio do companheiro se conseguir provar que houve uma "sociedade de fato" – ou seja, que houve dispêndio de dinheiro ou esforço pessoal comum para a compra do bem.
Marido e mulher são igualmente respon- sáveis pelas dívidas contraídas por ele?
A lei prevê que o cônjuge seja solidário no pagamento das dívidas particulares do parceiro ou comuns ao casal se contraídas em benefício da família. Isso vale para qualquer regime de bens, inclusive o de separação total, exceto se estipulado diferentemente em acordo anterior.
É necessária a assinatura do casal para vender um imóvel que pertence a ambos?
Sim, seja qual for o regime de bens ou natureza dos bens.
No processo de separação, quais os documentos válidos para comprovar o padrão de vida, com vista à definição do valor da pensão?
Caberá ao interessado comprovar o padrão de vida que o ex-marido ou a ex-mulher oferecia à família até a ruptura da convivência. Independentemente do regime de bens, são provas com valor legal: atestados e certidões requisitados à Receita Federal, faturas de cartões de crédito, extratos bancários ou de aplicações financeiras, além de cadastros. Sinais exteriores de riqueza também entram no processo.
No testamento, o marido pode escolher algum filho ou outro parente para receber toda a herança?
Não. A mulher sobrevivente tem garantida a metade do patrimônio adquirido por ambos em caso de comunhão parcial. Os 50% restantes devem ser divididos em duas partes iguais: 25% destinam-se obrigatoriamente aos herdeiros descendentes e, na falta destes, aos ascendentes (ou seja, pais, avós). Os outros 25% podem ser distribuídos como o marido tiver estipulado no testamento – não se exige sequer grau de parentesco. Essa parte da fortuna pode ser deixada, por exemplo, para a antiga empregada da família que ajudou a criar seus filhos ou para uma instituição de caridade. O marido pode destinar esses 25% até mesmo para a esposa, o que faria com que ela ficasse com 75% do patrimônio total do casal. No regime de separação total de bens, a mulher não leva nada do marido, a não ser que seja contemplada pela vontade dele ou chegue a vez dela na ordem da fila.
Filhos fora do casamento têm direitos na partilha dos bens do pai?
Sim. A Constituição federal de 1988 igualou os direitos dos filhos, oriundos ou não do casamento.
Mulher separada perde a pensão se arrumar um namorado?
A mulher só perde o direito se passar a morar com o novo namorado.
A pensão alimentícia deve arcar com despesas extras dos filhos, como aulas de natação, judô ou balé?
Sim, a pensão deve bancar todas as despesas oferecidas aos filhos durante a convivência. A separação não deverá sacrificá-los no campo material, já que presenciaram o processo de ruptura familiar.
A namorada ajudou a pagar algumas parcelas do financiamento do apartamento dele, em cujo nome foi registrado. Ela pode requerer alguma parte do imóvel na Justiça?
Sim, caso seja comprovado o estabelecimento de uma "sociedade de fato" entre ambos para a compra do bem.
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